O Senhor Ibrahim e as Flores do Corão

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Quem são Momo e o Senhor Ibrahim?

Dois seres aos quais ninguém presta atenção. Momo, menino solitário, tem um pai que não merece este nome de tal modo o seu estado depressivo o impede de olhar pelo seu filho, de o educar, instruir, transmitir-lhe o desejo de viver, transmitir-lhe os seus princípios. Quanto ao Senhor Ibrahim, só lhe pedem que dê o troco certo. Estes dois seres vão modificar as suas vidas ao confrontarem-se. Este encontro vai enriquecê-los e muito. Especulou-se bastante com o facto de a criança ser judia e o merceeiro muçulmano. Têm razão. Da minha parte, foi absolutamente intencional. Assim, quis ao mesmo tempo testemunhar e provocar.

Testemunhar, porque em muitos lugares da terra – as capitais europeias, os portos, as cidades americanas, as aldeias do Maghreb – há uma coabitação harmoniosa entre pessoas com origens diferentes, religiões diferentes. Em Paris, na Rua Bleu, onde esta história se passa, uma rua onde vivi e que não é de modo algum azul, residia uma grande comunidade de judeus, alguns cristãos e também muçulmanos. Estes citadinos partilhavam não apenas a rua, mas também o quotidiano, a alegria de viver, os problemas, a conversa.

Provocar, para dar uma imagem positiva do Islão no momento em que os terroristas desfiguravam esta fé entregando-se a actos inconcebíveis. Se actualmente o islamismo insulta o Islão, se o islamismo corrompe o planeta, é urgente distinguir o Islão e o islamismo, arrancar dos nossos corações esse medo irracional do Islão e impedir que se confunda uma religião cuja sabedoria milenar guia milhões de homens com o palavreado excessivo e mortífero de certos agitadores.

Pareceu-me importante contar uma história feliz, uma história de fraternidade. O meu maior orgulho foi descobrir que, por exemplo, em Israel, os seguidores da paz, árabes, cristãos ou judeus, se servem do “ O Senhor Ibrahim e as flores do Corão” para tentar espalhar os seus ideais, fazendo-o representar no mesmo Teatro alternadamente, uma noite na versão árabe, outra na versão hebraica…

O sentimento fraterno que une o Senhor Ibrahim e Moisés, porque surge entre seres humanos cujos sentimentos estão próximos de nós, apaga o nosso receio do outro, esse medo que temos daqueles com quem não nos identificamos.

Quando Momo recuperar o velho exemplar do Corão, descobrirá o que havia no Corão do Senhor Ibrahim:flores secas. Mas o Corão do Senhor Ibrahim é tanto o texto como aquilo que o Senhor Ibrahim, ele próprio, aí depositou, a sua vida, a sua maneira de ler, a sua interpretação. A espiritualidade não consiste em repetir mecanicamente as frases mas em apanhar o sentido, em compreender o espírito, as subtilezas, a forma… A verdadeira espiritualidade só tem valor numa mistura de obediência e de liberdade. Eis finalmente a explicação que sempre me pedem sobre este misterioso título “O Senhor Ibrahim e as flores do Corão”.

Eric-Emmanuel Schmitt

Nota do Encenador

O Senhor Ibrahim e as flores do Corão é uma caixa de segredos. Como a loja do Senhor Ibrahim, o árabe que não é árabe e que vive na Rue Bleu ou como a cabeça e o coração de Momo, o menino judeu que preenche os dias, os sonhos e as insónias daquele velho muçulmano imigrante do Crescente Fértil. Por um lado, Muçulmanos e Judeus, e o cenário parece o do grande teatro da guerra; por outro lado, um velho e uma criança, e o palco é apenas uma caixa misteriosa em que se aprende a ternura, a vida e a morte, o perfume das flores que secaram dentro de um livro que é o Corão, mas que também podia ser a Bíblia ou a Thora.

O Senhor Ibrahim e as flores do Corão é uma caixa de segredos que se transforma num teatro de pequenos gestos. Com palavras, também. Mas é na densidade e na leveza das coisas mais simples que se vai construindo tecendo e entrelaçando a história de uma amizade através da qual o muçulmano adopta o judeu e o pequeno Moisés que é Momo é um Momo que se transforma também em Mohammed. E, pelo meio, há um porquinho-mealheiro que se parte para ir às putas da “Rua do Paraíso”, há um ursinho de peluche oferecido a uma mulher com quem se aprende a “fazer o amor”, há uma fotografia autografada com dedicatória por Brigitte Bardot na sua passagem pela Rue Bleu, latas de sardinha roubadas à socapa pelo canto do olho do velho merceeiro, uma caixa de paté oferecida à mistura com uma aula de sorrisos, as fotografias das pontes do Sena, uma paleta de tintas para encher de cor o apartamento da Rua Azul e um balcão transformado em carro com o qual se viaja até às terras do Crescente Fértil. Há a dança da vida na vida da dança. Ah, é verdade, e há também o Corão e as duas flores secas entre as suas páginas.

Tudo se passa numa loja que é um bazar. Para cá da loja, fica a cidade de Paris, com todo o mundo que lá chega e que daí parte. Para lá da loja, ou melhor, lá no seu fundo, no mais fundo do seu interior, há o calor de uma casa onde mora o Senhor Ibrahim e que na cumplicidade dos gestos e do olhar, acolhe também o pequeno Momo, e onde ele aprende que há formas de pensar que são doenças e que há pessoas que vivem mais quando aprendem a andar livremente por dentro do mundo e do pensamento. “O Senhor Ibrahim e as flores do Corão” não é o grande teatro do mundo, é o teatro dos pequenos gestos. É por dentro de cada um deles que passa a memória, a vida e a alegria. É por dentro de cada um deles que passam as suas histórias e também as histórias de todos os outros gestos. E é também por dentro de cada gesto que passam as suas histórias e também as histórias de todos os outros gestos. E é também por dentro de cada gesto que passam as palavras. A palavra ternura e a ternura das palavras. Os gestos de paz e a paz de cada gesto.

“O Senhor Ibrahim e as flores do Corão” é apenas o teatro mais simples da vida.

João Maria André (Encenador)

Nota de Produção

“(…) mas o céu e o ar são os mesmos para vós e para nós(…)”

Mahmed Darwich

Acredito, como Picasso, nesta ideia: “não procuro, encontro”. Foi o que me sucedeu com o livro “O Senhor Ibrahim e as flores do Corão” de Eric-Emmanuel Schmitt. Depois da sua leitura, de imediato se instalou em mim uma certeza: a urgência de divulgar um texto que, com desarmante simplicidade e incontornável poesia, nos conta uma história sobre a construção do amor fraterno, capaz de criar cumplicidades, respeito e tolerância, entre seres humanos de culturas e religiões diferentes (um árabe, outro judeu); Por incontornáveis razões, tudo faria supor a impossibilidade da sua relação e especial proximidade, daqui resultando uma singular riqueza para ambos. Esta é uma história de esperança, no mundo de hoje que, na sua insuportável dor quotidiana, reclama como nunca uma “arte de viver em tempos de catástrofe”.

Para esta aventura teatral desafiei um conjunto de artistas, com reconhecidas qualidades e mérito profissional, que com invulgar generosidade não hesitaram em aderir ao convite que lhes formulei. Este projecto, de forma intencional, vai para além da apresentação da peça de teatro, alargando-se a um conjunto de eventos paralelos, da poesia ao cinema, das artes plásticas à tertúlia, passando pela animação de uma oficina pedagógica. Procurar-se-á através de outras práticas artísticas explorar a temática central do texto eleito e aprofundar a reflexão suscitada pela obra escolhida de Eric-Emmanuel Schmitt, numa aposta clara para uma ideologia da paz.

À pergunta formulada por Amos Oz: “O que se pode fazer?” ele responde:

se eu fosse um europeu, teria cuidado especial em não apontar o dedo a ninguém. (…) faria o impossível para ajudar ambos os lados, porque ambos estão a ponto de tomar a decisão mais dolorosa das suas respectivas histórias. (…) Vai doer como o diabo. Por isso, se tem um bocadinho de simpatia para oferecer é chegado o momento de a oferecer aos dois pacientes. Já não é preciso optar entre estar a favor de Israel ou da Palestina, é preciso estar a favor da paz”.

É da mais elementar justiça prestar um público agradecimento ao Teatro Académico de Gil Vicente, na pessoa do seu Director Artístico, Prof.. Dr. Manuel Portela, que abraço desde o primeiro momento o projecto proposto, permitindo a sua viabilidade e possibilitando as condições técnicas e logísticas para a sua concretização, numa feliz parceria de co-produção. Não esquecendo ainda outras tantas entidades, empresas e pessoas singulares que igualmente prestaram o seu inestimável contributo. É certo que são inúmeras as dificuldades e obstáculos que se encontram pelo caminho, designadamente aqueles que se prendem com as condições de circulação e acolhimento, por parte dos teatros e equipamentos culturais espalhados pelo país, agravados pela falta de uma política de apoio à descentralização cultural e de uma prática de optimização dos recursos disponíveis. Mas já estou como Júlio Pomar que afirmava numa entrevista, no seu jeito atrevido: “quando há vontade, não há como adiar.”

Esta é uma produção sem rede, com risco. Mas que sirva, pelo menos, para fazer pensar e acreditar que é possível viver de outra maneira. Também é para isto que o Teatro deve servir. E ao cair do pano, levem convosco o sábio conselho do Senhor Ibrahim ao jovem Moisés: “O que tu deres, Momô, é teu para sempre; o que guardares, está perdido para sempre.”

Margarida Mendes Silva

Crítica

Eventos Paralelos

Ciclo de Cinema

“De ambos os lados”

9, 10, 11 e 13 de Julho (2007)


Instalação “Muro com Saída

de André Alves

Curadoria: Galeria Sete

de 2 a 17 de Julho (2007)

TAGV

Tertúlia

“Guerra e Paz”

com Anselmo Borges,

João Maria André,

José Manuel Rosendo

e José Manuel Pureza

3 de Julho (2007)

18h Foyer do TAGC

Sessão de Poesia

“Poemas Cruzados”

Poetas israelitas e palestinianos

com André Gago e Helena Faria

5 de Julho (2007)

18h Foyer do TAGV

Oficinas Pedagógicas

“Caminhos para a Paz” /

“Jogos sobre a Tolerância”

6, 7, 9 e 10 de Julho (2007)

11h Sala dos Espelhos TAGV




Locais de Apresentação

Leiria – Teatro Municipal Miguel Franco

Estarreja – Teatro Municipal de Estarreja

Torres de Moncorvo – Festival de Teatro

Lisboa – Instituto Franco-Português

Guarda – Teatro Municipal da Guarda

Covilhã – Teatro das Beiras

Coimbra – Teatro Académico de Gil Vicente e Teatro Estúdio Bonifrates

Vídeos

Música

Fotos

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